Chegança ou marujada

No folclore brasileiro, as “cavalhadas” representam a peleja entre mouros e cristãos, baseadas nas aventuras de CARLOS MAGNO, imperador cristão que lutou contra os sarracenos, de religião islâmica, no século VI de nossa era.

Este feito foi amplamente divulgado pelos trovadores que viajavam por toda Europa e chegou até nós através de histórias orais e escritas, principalmente “A BATALHA DE CARLOS MAGNO E OS DOZE PARES DE FRANÇA” que até hoje influenciam nossos cordelistas e romancistas, como por exemplo, Guimarães Rosa em GRANDE SERTÃO: VEREDAS, onde são constantes as citações deste relato tanto pelo narrador quanto nos diálogos de outros personagens.

A história de Carlos Magno se tornou tão popular que no século XII, em Portugal, a Rainha Isabel a tornou uma festividade, como forma de incentivar os cristãos a repudiar os muçulmanos, também chamados Mouros.

Ligada à Festa do Divino, esta festividade chegou ao Brasil, autorizada pela coroa portuguesa, através dos Jesuítas. Seu objetivo: catequizar os índios e os escravos africanos, mostrando a eles o poder da fé cristã.

 A Cavalhada é formada por 12 cavaleiros mouros, vestidos de vermelhos que se posicionam do lado onde o sol nasce, isto é, com as costas para o poente e 12 cavaleiros cristãos, vestidos de azul, que se posicionam do lado do sol poente,isto é, com as costas voltadas para o nascente, dando a idéia de um grande campo de batalha. Os cavalos, à maneira das Cruzadas, também são ornamentados com plumas, tecidos, etc., suas patas são pintadas de dourado e prata, sua cabeça protegida com metais polidos e adornada por penachos, as crinas longas enfeitadas com fitas coloridas.

As roupas mais luxuosas pertencem aos reis, assim como os cavalos mais bonitos e fogosos. O rei cristão e seu embaixador usam chapéus de 2 ou 3 pontas. Todos se trajam de azul, com camisas brancas de mangas largas.  Quando têm poder aquisitivo usam calços de veludo ou de cetim até os joelhos, meias soquetes brancas, botas de cano médio e esporas de rosetas pontudas.

O rei mouro, um capacete dourado, tipo romano. Tanto ele quanto seu séqüito usam saiotes em vez de calções e corpetes do mesmo tecido sobre as camisas. Adornam-se com galões dourados e trazem, no peito, um medalhão. Sobre os ombros, uma capa arredondada.  Seus animais também são adornados.

Todos os cavaleiros, cristãos e mouros, trazem uma lança também enfeitada com fitas e uma espada na cinta.  Na cabeça do arreio trazem pistolas carregadas de festim.

A arena onde se dá a “batalha” é circular, com aproximadamente cem metros de diâmetro e os guerreiros se encontram simulando um combate, com estranhas e bonitas coreografias. O primeiro combate é com a lança, depois se afastam e travam o segundo, com a pistola e, finalmente com a espada. Antes de terminarem a luta saem de campo. O término será no dia seguinte.

No final das festividades os cristãos vencem a luta e convertem os mouros ao cristianismo.

No segundo dia o combate continua até que os mouros simulam fraqueza e os cristão, exigem sua rendição. Os mouros, então, entregam seus cavalos e suas espadas. Após os diálogos finais os mouros são convertidos e batizados.

            No 3º. Dia, todos festejam a vitória dos cristãos com exibições diversas sobressaindo a “Tira Argolinha”. Nesta exibição, os cavaleiros que concorrem colocam-se em fila, com suas lanças e, dada a partida, disparam para tirar uma argolinha que está pendurada em um fio que é sustentado por duas traves, uma de cada lado do campo de prova.  Os que conseguem a proeza costumam oferece-las às namoradas ou a alguma autoridade presente na arquibancada.  Em troca, o homenageado retribui com uma jóia ou algum dinheiro.

            Tanto do lado mouro como do lado cristão, os exércitos têm uma hierarquia: no posto mais alto, o Rei. Abaixo dele o Embaixador e, em seguida os 10 cavaleiros restantes. Os participantes são fixos e se acontecer a morte ou desistência do Rei o Embaixador toma seu posto e, por sua vez, é substituído por outro cavaleiro. E assim sucessivamente.

Durante a Cavalhada aparecem, também, os Mascarados que, como o nome indica,  se vestem com máscaras, roupas coloridas, luvas, fitas, botas etc., cobrindo o corpo de maneira que ninguém o reconheça. Mudam a voz quando pedem bebidas, cigarros, dinheiro, doces aos espectadores e os divertem com acrobacias, cambalhotas e cantorias. São uma atração tão grande quanto os Cavaleiros.

O Mascarado mais comum é aquele que com máscara de cabeça de boi, de diabo e de animais.  Atualmente surgiram os mascarados com máscaras de borracha, principalmente de monstros apresentados no cinema e na tv. Ainda que descaracterizem a festa, não diminuem sua beleza.

Comum também é o mascarado São Caetano, assim chamado por vestir-se e enfeitar seu cavalo com ramas do melão de São Caetano, trepadeira comum no interior do Brasil. Este mascarado se caracteriza por uma mascara de homem com um chifre na testa. Enfim, existem diversos mascarados com nomes e roupas diferentes, mas todos eles representam o povo que não tem acesso à riqueza e à pompa dos cavaleiros, representantes da elite e do poder. Sua origem não é conhecida, mas, provavelmente, foram criados no Brasil, e – é suposição nossa – foram inspirados nos palhaços de feira, ou dos circos de meia lona.

Por curiosidade acrescentamos que eram chamados de “circo de meia lona” aqueles cujos espetáculos eram apresentados num pequeno picadeiro cercado apenas por lona alta, sem cobertura.

Mestre Aurélio define as Cavalhadas como: “Folguedo popular que consta de uma espécie de justa ou torneio.” E são estas justas, estes torneios, como tantas outras manifestações de nosso folclore,  que encantam e preservam as tradições de nossa brava gente brasileira.

Autor: Yassír Chediak

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